domingo, 3 de março de 2013

52- Tempos de Emater



52- TEMPOS DE EMATER




O final de 75 deu-me, pela primeira vez, a sensação de que se aproximava a hora de Chiara ir embora. Algumas coisas se confirmavam. Minha ida para o Sul, principalmente, anunciava-se como um acerto de suas previsões.
        Naquele ano, mais uma vez, fiz o Festival de Inverno. Desde a morte de Carmela, eu havia pensado que não teria coragem de fazer outro. Sandra, minha amiga, convenceu-me. Resolvi, então, fazer um curso de Litografia com Quaglia, um excelente professor, de quem eu já era amigo.
        Tive a chance, nesse festival, de conhecer duas gaúchas: Zilá e Neli. Aliás, ficamos nos conhecendo um dia, na sala de aula, quando uma delas perdeu a lente de contato, e eu tive a sorte de achar, no lugar menos provável e mais difícil de encontrar: no tanque de água, no meio da umidade onde ela ficava quase imperceptível. Ficamos amigos depois disso, e Zilá me fez o convite para trabalhar em Rio Grande, num curso novo de Educação Artística que a universidade local pretendia abrir. Aceitei. Ela me chamaria no momento em que o Curso estivesse para começar.
        Descobri ali, naquele festival, que eu me dava muito bem com os gaúchos. A maioria de amigos que fiz era do Sul: Nelson Elwanger, Cláudio Eli, Armando Almeida, Paulo Perez e Anete, Paulo Chimendes, Anico Herskovits, Ana Alegria e outros. Tudo se encaminhava para, mais uma vez, Chiara acertar em cheio. Bastava-me esperar, que tudo iria acontecer.
        Quis, então, desafiar, mais uma vez, aquela afirmação de Chiara.
        Comecei o ano de 1976 procurando emprego. Os trabalhos de ilustração haviam minguado por uma determinação do Instituto Nacional do Livro, estipulando um prazo mais apertado para as editoras apresentarem os livros para o ano escolar. Na pressa, elas, as editoras, preferiram contratar agências de publicidade que ilustravam o livro muito mais rápido do que eu e a Sandra. Eu fiquei, outra vez, totalmente sem dinheiro. Uma ou outra capa de livro que amigos me conseguiam não rendiam o suficiente para que eu fosse muito longe. Estava com a pensão atrasada e contando com a boa vontade e bom coração de Dona Nilda, a proprietária. Nessa época, eu não pedia mais dinheiro de casa. Virava-me como podia. Consegui umas aulas particulares de desenho. Tinha três alunos e o que eu arrecadava com os três equivalia mais ou menos a um salário mínimo da época. Oitenta por cento daquele dinheiro correspondia à mensalidade da pensão. Fumava porque filava dos amigos compreensivos. Pelo menos, na pensão, eu tinha almoço e janta até sábado e almoço aos domingos. No final desse dia, como não havia janta, eu corria sempre à casa de um amigo quando tinha fome. Dona Célia e Seu Alberto, pais de Sandra, convidavam-me sempre para o lanche do fim da tarde. Muitas vezes fui também à casa de meu irmão Zezé, onde era garantida uma janta reconfortante.
        Por volta do mês de maio, meu amigo Aluízio conseguiu para mim, um emprego fixo na EMATER (à época, ACAR). Aquilo conseguiu fazer com que eu recuperasse a auto-estima. Pude pagar de novo tudo o que eu devia e andar outra vez de cabeça erguida. Era ótimo trabalhar ali: eu gostava de todos, e todos gostavam de mim. Cresci rápido no novo emprego. Em 1977 houve a mudança de nome da empresa. Muitas mudanças para ampliá-la foram propostas, inclusive a transformação da Seção de Arte em que eu trabalhava, para um novo Serviço de Artes Gráficas, que juntava em um só setor a seção dos desenhistas com o Parque Gráfico da Empresa. Fui convidado pelos novos diretores para chefiar aquele serviço. Havia obtido um excelente progresso em menos de um ano. Infelizmente, alguns colegas não conseguiram lidar muito bem com aquela minha promoção. Funcionários mais antigos (e eu não tiro a razão deles) sentiram-se preteridos e prejudicados. Eu só aceitei porque havia a promessa de contratar pessoas de fora caso eu não aceitasse. Fiz as pazes com todos, que descobriram que eu não havia usado nenhum tipo de subterfúgio para conseguir aquele cargo.
        Não pude evitar, no entanto, de me indispor com Rubem Marchi e Otomar, dois diretores pedantes, da nova equipe que fora contratada no momento de ampliação da empresa. O fato de termos nos transferido para um prédio no Barro Preto aliviou um pouco a tensão. Era quase certo, eu sabia, que eu não ia agüentar. Pude, contudo, formar uma excelente equipe de desenhistas: Rosângela Quinaud e Sandra Cristina (antigas colegas de escola) Quintino Boaventura, Selma e os antigos companheiros: Sérgio Zorzin, Aluísio, Maia e Ângela. Havia ainda: Tânia (a revisora) Magdala, Dirce, Dulce e Terezinha, na composição de textos. Vivemos bons momentos juntos.

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